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VALE TUDO


O vídeo em questão parece mais uma daquelas filmagens caseiras que fazemos quando realizamos uma festa no quintal de casa ou então quando de posse dos nossos “celulares inteligentes” saímos gravando tudo que vemos pela frente e depois postamos na internet como neo-cineastas. Bem, este é um desses típicos vídeos. Quem, por sua alta concepção cultural e/ou moral religiosa ou familiar assistir esse vídeo certamente agirá como alguns dos comentários postados ao longo da página de facebook que publicou o tal vídeo. Comentários moralistas, machistas, homofóbicas e outras patologias. Sim, é claro que encontramos em meios a tais comentários preconceituosos aqueles(as) que parecem estar mais abertos a esse tipo de expressão cultural. Em suma, também não me darei ao trabalho de tratar da questão cultural do vídeo e entrar na discussão se é ou não cultura o tipo de música e/ou o tipo de dança e outras coisas mais.


O que me chamou atenção neste vídeo foi o caráter comum das manifestações artísticas apresentadas no mesmo. Tanto o cara que filmou o vídeo quanto os dançarinos e dançarinas e também é claro a comunidade que participa desse “baile de forró” me pareceram estar apenas passando um dia de diversão. Ao final do vídeo percebemos que este baile aconteceu numa espécie de clube, chácara ou alguma espécie de fazenda, enfim, em algum lugar com espaço de lazer próximo a um lago ou rio. Muitas pessoas estão envolvidas.


Ao iniciar o vídeo um casal de dançarinos (homem e mulher) chama logo atenção das câmeras. Ora, também pudera. A capacidade de movimento deste casal é simplesmente contagiante. Ao longo dos minutos do vídeo outro casal aparece mostrando seus talentos na pista. Até então apenas dois casais estão dançando enquanto uma roda de observadores está parada estática olhando os casais dançarem, assim como eu também fiquei. Aos poucos outros casais entram na pista de dança mostrando para que vieram. E olha que vieram para mostrar que dança é sua praia. Não tão longe, casais menos dotados de conhecimento de dança entram na pista e caem na dança. Casais de idosos, de jovens e inclusive casal de mulheres. Nada novo até então, correto? Quem nunca viu duas mulheres dançando e nunca deu importância para aquela cena?


Ao longo do vídeo, os dois rapazes, que considero os dançarinos focos do vídeo (e da festa) resolvem dançar juntos. Isto mesmo, eles dançam juntinho, um com o outro. E o que chama atenção? Por mais difícil que pareça, o que chama atenção não é este casal de homens dançando, mas a reação do povo e a normalidade que o camera man dá àquela situação. Enquanto os dois homens dançam a comunidade continua dançando, observando, comendo, se divertindo. Ninguém parou suas atividades daquele momento apenas para repararem a “aberração” de terem naquela festa dois homens dançando juntos enquanto várias mulheres estavam paradas apenas observando, desocupadas.


Mas porque motivo deveria a comunidade parar de dançar e se divertir para observarem aqueles homens dançando? Ao menos se fosse o motivo de que eles dançam bem pra caramba! Eu mesmo se estivesse naquela festa parava de fazer o que estivesse fazendo e iria correndo ver os dois dançarem juntos, já que separados já chamavam atenção pelo fato de requebrarem muito bem, imaginem juntos?!


Neste vídeo não vejo ligação alguma com a homossexualidade e se tivesse não diminuiria a importância da reação dos envolvidos(as). Ver a comunidade lidando com aquela situação de forma tão natural de igual forma de como ver um casal de homem e mulher ou até mesmo um casal de mulheres dançando é simplesmente cativante.


Acredito que mais do que o entendimento da questão do respeito, da homofobia, machismo e todas essas teorias o que se presencia na comunidade é simplesmente a vivência sadia. Numa relação como aquela não cabe a segregação. A celebração da vida através da música e do encontro comunitário deve ser a porta para a pessoa experimentar as relações sociais e não as segregações.


No meu ponto de vista não cabia naquela festa manifestações antissociais que diminuíssem a alegria daquele povo e daqueles(as) dançarinos(as). A forma como o cara da gravação lidou com aquela situação para mim foi esclarecedora de como a mídia revela seu papel hipnotizador e construtor de (pré)conceitos. A visão do cinegrafista revela suas políticas e suas crenças quando o mesmo é capaz de dar foco em uma situação em detrimento da outra. A comunidade, por sua vez, se mostrou “nem ai” com aquela situação. E porque deveria? Afinal, não há nada extraordinário acontecendo ali naquele momento senão pessoas dançando. E convenhamos que dançando pra caramba!


Esta é uma oportunidade de começar a quebrar os preconceitos e normas estabelecidas para o papel masculino e feminino. É hora de desconstruir a ideia de que o homem que é homem não chora e não dança (sequer toca) em outro homem, muito menos quando a dança é tão sensual. É hora de desfazer a ideia de que ao homem foi reservado a obrigação de chefia, de ser forte e à mulher o papel de ser submissa e frágil não dando importância sequer quando a mesma resolve dançar com outra ou até mesmo tomar banho juntas. Em nossa sociedade não cabe mais essas segregações que além das diversas causas de violências ainda pode ocasionar o não aproveitamento das atividades culturais que se está envolvido e voltar para casa sem ter vivido muita coisa e ter perdido a chance de gozar da felicidade, de se reunir em comunidade e celebrar a alegria de se estar vivo(a).


Eu poderia dizer outras coisas, mas não é papel deste pequeno escrito onde procurei escrever aquilo que minha mente leu nas entrelinhas das filmagens deste vídeo. E ao contrário do que cantou Tim Maia anos atrás, nesta comunidade vale tudo e vale o que quiser, inclusive vale também dançar homem com homem e mulher com mulher, e a comunidade ainda segue sem perder o ritmo e o compasso da música dos Garotos de Ouro que toca: “Você nunca me amou e só me quer pra aquela hora, me pega vuco, vuco, vuco, vuco e vai embora...”

Tim Maia anos atrás escreveu um de seus sucessos musicais chamado “vale tudo”. No refrão desta música, que querendo ou não, cola em nossa mente como chiclete, diz assim: “vale tudo, vale o que quiser, só não vale dançar homem com homem e nem mulher com mulher”.  Não irei entrar no mérito da discussão homofóbica e/ou machista neste texto, deixarei a cargo dos meus outros amigos e amigas ativistas. Nem sequer a música do Tim Maia é foco deste texto. Irei me deter diretamente à questão cultural ligada ao “baile de forró” de um vídeo veiculado na facebook que tem como título “Que diabos é isso? Queima Jeová!” publicado no perfil @Frases de Boleiros.

Para assistir o Vídeo discutido neste texto: Clique Aqui!

Atlanta, 25 de Maio de 2013.



por José Aniverson Souza dos Santos

Especialista em Juventude/FAJE

Blog do Aniervson

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